A MINHA GUERRA ?????
Por: Ex-Furriel Miliciano Ramiro Daniel Pedrosa Viegas |
O EMBARQUE
No dia 08 de Julho de 1968, fui à inspecção médica da Junta de Recrutamento, tendo sido aprovado para todo o serviço militar.
No dia 08 de Janeiro de 1969, sou incorporado no exército, no C.I.S.M.I. em Tavira. Nesta mesma Unidade Militar C.I.S.M.I. fiz a recruta que teve um período de três meses, Terminada a recruta, permaneci na mesma Unidade para fazer a Especialidade de “Sapador” até final do mês de Julho de 1969.
No final de Julho de 1969, fui transferido para a Escola Prática de Engenharia em Tancos, para frequentar uma Especialização de “Minas e Armadilhas”, onde permaneci até 06 de Setembro de 1969. Após a frequência desta Especialidade, fui transferido para O Regimento de Infantaria de Bragança.
A 7 de Janeiro de 1970, vindo do Regimento de Infantaria de Bragança, fui destacado para o RI 1 (Regimento de Infantaria 1) na Amadora para aí ser integrado num Batalhão de Caçadores 2904. Este era constituído por quatro Companhias, C.C.S. (Companhia de Comando e Serviços), pelas Companhias de Caçadores, C.CAÇ. 2655, C.CAÇ 2656 e C.CAÇ 2657.
Permanecemos neste quartel, sempre numa incerteza, relativamente à data em que partíamos. Ora estávamos mobilizados para a Guiné, desmobilizando-se o Batalhão de seguida ora, estávamos mobilizados para Moçambique, desmobilizando-se mais uma vez o Batalhão até que, finalmente veio a ordem de mobilização para a Região Militar de Angola.
Em virtude das constantes alterações de mobilização e desmobilização, estando tão perto de casa não tinha a oportunidade de vir ver os meus pais, irmãos, namorada, amigos, enfim despedir-me destes, talvez até breve ou de um “ADEUS” definitivo.
Pela primeira vez, ultrapassei as normas regulamentares pois, a partir do momento em que soubéssemos a data de embarque, as saídas do quartel para visitas a casa terminavam. O nosso espólio individual já se encontra há muito tempo encaixotado e identificado, somente ficávamos com o mínimo indispensável para o dia a dia, relativamente a este espólio, com o pensamento negativo de “não mais regressar” enchi-me de coragem e zarpei do quartel, na gíria militar “Desenfiei-me”, saindo por uma zona que os soldados habitualmente utilizavam para sair do quartel. Permaneci em casa nos dias 16 e 17 de Fevereiro. Na madrugada do dia 18 de Fevereiro de 1970, o meu irmão Francisco foi levar-me ao quartel na Amadora. Eram oito horas da manhã quando ali cheguei, pelo local de saída foi por onde entrei. Já havia um grande movimento quer de viaturas quer dos camaradas no transporte do seu espólio individual para junto dos locais definidos para cada Companhia para colocar nas viaturas e entrarmos nestas com destino à Rocha Conde de Óbidos em Lisboa.
O trajecto entre o R.I. 1 (Regimento de Infantaria 1) – Amadora e a Rocha Conde de Óbidos foi relativamente rápido. Encontrava-se atracado ao cais um navio da Companhia Colonial de Navegação de nome “UIGE”, as rampas de acesso ao navio, encontravam-se abertas e disponíveis. À medida que íamos saindo das viaturas e, não termos autorização para nos aproximarmos dos familiares que ali se encontravam a dizer o seu adeus, alguns, ousaram romper contra estas regras e aproximavam-se dos seus familiares na sua despedida.
Eu, porque tinha pedido aos meus familiares que não cria que comparecessem, subi a rampa de acesso, dirigindo-me ao camarote que me estava destinado onde fui depositar o meu espólio individual. Após deixar a respectiva bagagem, subi para o convés e, fui sentar-me bem lá no alto, junto de uma baleeira.
Recordo-me de ver os familiares, e amigos de outros camaradas na Rocha Conde de Óbidos, limitados por um gradeamento ali colocado para que o contacto com os seus familiares não fosse possível, choravam, gritavam pelos nomes num pranto de desespero e incerteza, acenavam lenços brancos, cada um expressava o desgosto como sentimento diferenciado. Era aquela vivência que eu não queria viver naquele momento por isso, não estava nenhum familiar mas, ao ver toda aquela angústia das famílias fiquei mais carregado de dúvidas e incertezas, tanta coisa se passava rapidamente pela minha cabeça interrogando-me,” Porque não fugi à tropa quando tinha quinze anos, quando o meu irmão Jorge com dezassete anos resolveu fugir para França que até me aliciou a fazer” não o fiz porque, estava convencido que quando chegasse o momento de ir para a tropa a “Guerra já tinha terminado” enganei-me.
Pensativo assistindo a toda aquela incerteza que pairava nos familiares que ali aguardavam pelo desatracar do navio, continuei junto à baleeira. Após retirarem as rampas de acesso ao “UIGE”, já se encontravam três rebocadores amarrados ao barco para procederem à manobra de desatracar do navio um encontrava-se à ré, rebocando a ré do navio para fora, afastando este do cais, o segundo, estava amarrado à proa, rebocando o navio, afastando a proa do cais, quando o navio chegou ao meio do rio Tejo, os rebocadores da ré e da proa destinados a fazer a manobra de afastamento do navio do cais, desligaram a sua ligação ao “UIGE” iniciando-se, através do terceiro rebocador, a manobra de reboque em direcção à saída do rio Tejo, esta operação levou algum tempo, até que, este terceiro rebocador também largou as amarras tendo o navio começado a navegar pelos seus próprios meios.
A minha permanência junto à baleeira continuava mas, desta vez chorava pensando “regressarei”, estava correcto o conceito de empenhar-me na defesa da Pátria e da Bandeira? Tinham razão os que desertaram, como fizeram alguns? Confuso, ao passar por debaixo da Ponte de Salazar (25 de Abril), o Bugiu estava ali tão perto do navio e, em breve momentos passámos Cascais entrando no alto mar, imaginava os rostos das pessoas que gostavam de mim mas que, não puderam, por sugestão pessoal, de estar ali naquele dia a despedirem-se.
Era hora do almoço, desci de junto da baleeira e, dirigi-me para a sala de refeições do navio destinado aos oficiais e sargentos. Recordo-me do mau estar que me causava o cheiro da cera dos corredores, que nos conduziam à sala de refeições que ficava num piso inferior ao convés e, do cheiro da comida. Foi a minha primeira grande viagem de barco, com os correspondentes reflexos originados pelo enjoo. O inalar destes dois cheiros para mim era agoniante pois, eu nunca fui grande adepto de andar de barco, não tinha nenhuma vocação para marinheiro mas, nos catorze dias, que foi o tempo que levámos de Lisboa até Luanda até, marinheiro fui obrigado a ser. Apesar da indisposição que os cheiros me provocavam ainda consegui almoçar e jantar no primeiro dia.
Após o almoço, durante a tarde do primeiro dia de navegação, tive a curiosidade de ir verificar as condições em que os soldados seguiam viagem, constatei a desumanidade em que estes ali foram colocados, amontoados, as refeições destes era ração de combate, eram mesmo “Carne para Canhão”. No meu espírito instalava-se um mau estar um misto de revolta, sofrimento e, ainda estávamos no início de uma viagem cujo retorno era desconhecido no seu dia e na sua forma.
No segundo dia de viagem, recordo que tentei levantar-me e dirigir-me a sala de refeições quer, para tomar o pequeno almoço, almoço e jantar mas, os cheiros da cera da comida provocavam-me vómitos, vinha num corredor para a sala de refeições, descia as escadas em direcção a esta mas, de seguida subia as escadas do outro lado seguia o corredor e dirigi-me para o camarote onde permaneci os catorze dias de viagem deitado, alimentando-me de fruta que tinha levado de casa. Ao largo da Guiné ainda me levantei e vi pela vigia do camarote um grupo de golfinhos que percorriam o oceano ao lado do navio.
Enquanto permanecia em plena viagem no navio deitado no camarote, através de outros camaradas ia tendo conhecimento de algumas novidades de situações que ocorriam no navio. Lembro-me com muita frequência, quando me disseram que o furriel Manuel “Rodinhas” porque era da manutenção, todas as noites tocava viola e cantava no porão onde os soldados se encontravam e, um dia resolveu tocar e cantar a canção do cantor “António Freire” - Pedra filosofal. Disseram que foi espectacular como a canção ecoou pelo navio, naquela noite serena e silenciosa em alto mar com todos os que assistiam a acompanhar cantando em uníssono. Perante tal espectáculo, entra pelo porão o comandante do batalhão, proibindo o furriel de cantar aquela canção e, retirou a guitarra, proibindo este que continuasse com aquela mui nobre diversão. Era efectivamente o primeiro acto carregado de significado político, que o comandante do batalhão até aquele momento tinha assumido com clareza.
No dia 01 de Março de 1970, eis que o “UIGE” chega à baía de Luanda, capital da Região Militar para onde o nosso Batalhão tinha sido mobilizado mas que, não sabíamos ainda qual a zona onde íamos ser instalados, falava-se que na primeira fase, primeiros doze meses seria para Ambriz e Ambrizete depois, logo se saberia onde terminaríamos a segunda fase dos restantes doze meses pois, em princípio a comissão seria de vinte e quatro meses, dividida em dois períodos de doze meses.
A manobra de atracagem foi efectuada com normalidade, eu estava expectante quanto ao meu comportamento físico quando me levantasse para sair do navio, seria igual ao que vivi, sempre que fui às Berlengas? Que parecia um tontinho enjoado e sem saber onde colocava os pés?.
Após terminada a amaragem do navio ao cais, foi dada ordem para sairmos deste. Chegado ao convés, senti aquele cheiro de África diferente, encontrava-se uma manhã bastante quente afinal, aquele medo da sensação do chão fugir após tantos dias deitado no beliche do camarote do navio, não causaram quaisquer perturbações físicas. Saímos do navio, entrámos num comboio de mercadorias, “como se de mercadoria se tratasse”, que nos levou até ao “GRAFANIL” Centro de concentração de todas as unidades em movimento de e para qualquer ponto da Região Militar de Angola quer, quando iniciavam a sua comissão ou quando a terminavam de regresso à metrópole. Mais uma vez não sabíamos qual o nosso destino na Região Militar de Angola, por diversas vezes o Batalhão esteve preparado no “GRAFANIL” para partir mas, aconteceu que fomos também por diversas vezes retidos neste quartel devido às alterações do nossos destino.
A C.C.S.,permaneceu em Luanda ainda uns nove dias, neste período permitiu-nos, com programação militar, que visitássemos as fábricas de cerveja “NUCA” e “NOCAL” onde nos foram servidos, para além da visita ao sector produtivo das fábricas umas boas cervejas frescas pois, assim indicava a temperatura, acompanhado com aperitivos nunca antes saboreados como caju, pistachos. Apesar do Grafanil se encontrar relativamente distante de Luanda, no tempo de lazer, havia a possibilidade de sairmos deste aquartelamento e, percorrer toda aquela extensa estrada, vislumbrando as precárias condições em que os naturais viviam. Apesar destas incongruências, Luanda eram uma cidade esplendorosa, a visita à bela avenida de Luanda com a seus pés, as esplanadas espalhadas pelo centro de Luanda e pela marginal, a ida à praia de Luanda que, tinha uma particularidade interessante pois, de um lado era o mar calmo da baía do outro, o mar agitado do atlântico. O ambiente em Luanda era fantástico as suas esplanadas onde, a baixo custo se comia camarão e se bebiam umas cervejas, possibilitando também a circulação pelo belo bairro da Bela Vista, onde se encontravam a residir bastantes portugueses ligados à pesca e, para aqueles que gostavam de dançar, podiam ai, aos fins de semana usufruir de um ambiente onde, frequentemente decorriam bailaricos.
A 15 de Março, com destino ao enclave de Cabinda, saiu do Grafanil, em primeiro lugar a C.C.S., em coluna motorizada, em direcção ao porto de Luanda, para depois entrarmos numa barcaça da Marinha de Guerra Portuguesa que nos levou, num trajecto de doze horas em alto mar junto à costa de Angola rumo a norte, até ao porto da cidade de Cabinda. O mar era calmo o ar quente, a escuridão da noite em alto mar era uma mescla de sensações, por um lado desesperante mas, aquele calor nocturno irradiava uma serenidade, sempre com uma carga psicológica de incertezas. Ao longe, quando nos aproximámos do porto de Cabinda, víamos espalhados pelo oceano, diversos pontos de fogo, diziam-nos os fuzileiros, que nos transportavam na barcaça que, eram as plataformas do petróleo explorado pelos Americanos naquele território.
Aqui chegados, ao porto de Cabinda, cruzámo-nos com os outros camaradas que iríamos render no “Belize” vila entranhada na extensa mata do Maiombe. Nesta Companhia que íamos render, seguia até ao final da sua comissão para a zona de Ambriz e Ambrizete, encontrei alguns camaradas do Concelho de Peniche. Naquele curto espaço de tempo que tivemos para conversar, houve a oportunidade de transmitir-me algumas preocupações daqueles que deixavam o território de Cabinda, deixando recomendações e avisos, desejando que a comissão ali decorresse bem. (Infelizmente para um desses camaradas que era natural de Geraldes a sua chegada ao Ambriz foi fatal tendo vindo a falecer numa emboscada). Cumpridas as formalizações burocráticas da recepção do equipamento móvel, já era meio- dia altura de comer a ração de combate que nos foi distribuída em Luanda antes da partida. Após a refeição subimos todos para os Unimogues. Assim que subi para o Unimoge, a minha primeira preocupação foi sentar-me no meio dos soldados e tirar qualquer sinal que me identificasse como graduado, alguns soldados interrogaram-me por eu tomar aquela atitude, expressei-lhes as minhas preocupações a partir daquele momento e que, todos os cuidados eram poucos e o mais pequeno pormenor podia vir a ser fatal, compreenderam a minha atitude que, apesar das constantes repreensões dadas pelo Comandante do Batalhão a mantive sempre, exceptuando quando me deslocava, à cidade de Cabinda. Apesar de nos terem informado que os 200 km que iríamos percorrer entre a cidade de Cabinda e o Dinge ser em estrada alcatroada e de segurança. Percorridos poucos kilómetros após a saída do porto de Cabinda, passámos por uma aldeia, (de condomínio fechado) pois só os Americanos e alguns quadros da empresa que explorava o petróleo ao largo de Cabinda ali viviam, em casas onde se destacava os equipamentos de ar condicionado e, todo o piso era verdejante, contudo, o silêncio era de cortar à faca, o dedo no gatilho e o olhar para a mata era uma constante, cada um de nós carregava no seu semblante uma enormidade de dúvidas sobre o que iria encontrar contudo, o silêncio sufocava de tal modo que não permitia qualquer troca de palavras, a atenção no trajecto era enorme os olhares procuravam até onde desse o descortinar de qualquer movimento estranho, começava ali naquele momento a odisseia que nenhum de nós de certeza queria viver. A imposição do regime colocava-nos numa situação de incógnita, como terminaria a comissão? saía dali VIVO ou MORTO? Era a interrogação pessoal mas que, de certeza que era comum a todos os camaradas que, naquele momento seguiam em caravana espaçada, conforme determinavam as regras militares naquelas circunstâncias pois, a guerra era um facto, não era um sonho ou uma brincadeira.
Percorridos os 200 km chegámos ao Dinge, ponto de paragem obrigatória e planeada pois, era o local onde nos aguardavam dois pelotões, do Batalhão que íamos render e que, nos iriam conduzir até ao aquartelamento de destino “Belize”. No Dinge encontrei dois camaradas de Peniche, o “Manuel ICA” e o “José Capelas”, apesar da preocupação e tensão interior, foi com bastante alegria aquele encontro, pois a zona onde se encontravam era calma não havia problemas de qualquer natureza e, tudo decorria normalmente, por vezes lá iam fazer uma escolta às viaturas civis que transportavam os mantimentos para o Batalhão que se encontrava na mata do Maiombe e também uma Companhia que se encontrava no Chimbete. Estes momentos permitiram retemperar as energias libertando um pouco a tensão daqueles 200 km. A partir do Dinge, a estrada alcatroada terminou dando lugar à picada, piso desconhecido, cheios de buracos e ressaltos das raízes das árvores, riachos sem pontes para passar, tínhamos entrado nas entranhas da mata do Maiombe, só se via a viatura que seguia à nossa frente, todas elas abanavam para um lado e para o outro, os nossos corpos sentados em cima dos bancos de madeira batiam no camarada da direita e da esquerda, tal era o estado do piso da picada, eram só árvores e mato não se via mais de meio metro do banco onde nos encontrávamos sentados na viatura até à mata, o coração volta a bater, as dúvidas ressaltam de novo a atenção é redobrada, o silêncio sufocante, cada vez é maior, à medida que a noite começa a surgir. Foi uma eternidade até chegarmos à tão desejada Vila do Belize, ao quartel onde a CCS se iria instalar.
O batalhão levou dezanove dias até se encontrar totalmente instalado nos respectivos aquartelamentos destinados a cada uma das Companhias que o constituíam.
Chegado ao Belize, terminou uma fase a que eu designei por “EMBARQUE”. Contudo novos desafios me foram colocados os quais irão ser descritos nas minhas memórias.
BATALHÃO DE CAÇADORES 2904
ÁGUIAS DO MAIOMBE
Por: Ex-Furriel Miliciano Ramiro Daniel Pedrosa Viegas |
Constituído pelas Companhias:
C.C.S.
C.CAÇ. 2655
C.CAÇ. 2656
C.CAÇ. 2657
O Batalhão foi constituído no R.I. 1 na Amadora, onde permaneceram todas as Companhias a aguardar o destino final pois, tivemos por diversas vezes mobilizados, ora para a Guiné, onde o Spínola não autorizou a deslocação do Batalhão por divergências com o Comando do Batalhão. Tivemos também, segundo informações que correram entre os camaradas, mobilizados com destino a Moçambique para onde não seguimos até que, finalmente fomos mobilizados com destino à Região Militar de Angola, sem zona de intervenção definida.
Embarcámos a 18 de Fevereiro de 1970 num navio da Companhia Colonial de Navegação “UÍGE” de seu nome. Desembarcámos no porto de Luanda a 01 de Março de 1970 Aí chegados, fomos colocados como de mercadoria se tratasse num comboio de mercadorias com destino ao “GRAFANIL” Centro de concentração de todas as unidades em movimento de e para qualquer ponto da Região Militar de Angola.
Na sala de refições do “UIGE”
Permanecemos em Luanda ainda uns quinze dias, neste período tivemos a oportunidade de visitar as fábricas de cerveja “NUCA” e “NOCAL” onde nos foram servidos com essa boa cerveja aperitivos nunca antes saboreados como caju….., a bela Avenida de Luanda com a baía esplendorosa a seus pés, a praia de Luanda que tinha uma particularidade interessante pois, de um lado era o mar calmo da baía do outro, o mar agitado do atlântico. O ambiente em Luanda era fantástico as suas esplanadas onde, a baixo custo de comia camarão e se bebiam umas cervejas, possibilitando também a circulação pelo belo bairro da Bela Vista, onde se encontravam a residir alguns nossos conterrâneos o Senhor Manuel Salsinha esposa e filha entre outros alguns armadores da pesca (Proprietários de embarcações de pesca) e outros portugueses ligados à pesca, para aqueles que gostavam de dançar, podiam usufruir de um ambiente onde frequentemente decorriam bailaricos.Enquanto permanecemos em Luanda, tivemos a oportunidade de conhecer a Cidade bem como usufruir das praias que a cidade tinha.
Num momento de laser, na praia situada na ponta da baía de Luanda os Furrieis Viegas e
Henrique Malheiros. Ao fundo vislumbra-se Luanda
A 15 de Março, com destino ao enclave de Cabinda, saiu do Grafanil, em primeiro lugar a C.C.S., em coluna motorizada, em direcção ao porto de Luanda, para depois entrarmos numa barcaça da Marinha de Guerra Portuguesa, “ARIETE” que nos levou, num trajecto de doze horas em alto mar junto à costa de Angola rumo a norte, até ao porto da cidade de Cabinda.
O Furriel Viegas num ponto estratégico do “ARIETE” para não enjoar na viagem
Aqui chegados ao porto de Cabinda, cruzámo-nos com os outros camaradas que iríamos render no “Belize” vila entranhada na extensa mata do Maiombe. Nesta Companhia que íamos render, que seguia destacada até ao final da sua comissão para a zona de Ambriz e Ambrizete, encontrei alguns camaradas do Concelho de Peniche. Cumpridas as formalizações burocráticas da recepção do equipamento móvel, já era meio dia, altura de comer a ração de combate que nos foi distribuída em Luanda antes da partida. Após a refeição subimos todos para os Unimogues. Assim que subi para o Unimoge, a minha primeira preocupação foi sentar-me no meio dos soldados (Na madeira, como designávamos os bancos da viatura) e tirar qualquer sinal que me identificasse como graduado, alguns soldados interrogaram-me por eu tomar aquela atitude, esclarecíamos sobre quais eram as minhas preocupações a partir daquele momento e que todos os cuidados eram poucos e o mais pequeno pormenor podia vir a ser fatal, compreenderam a minha atitude que, apesar das constantes repreensões dadas pelo Comandante do Batalhão a mantive sempre, exceptuando quando me deslocava, à cidade de Cabinda. Apesar de nos terem informado que os 200 km que iríamos percorrer entre a cidade de Cabinda e o Dinge, a estrada ser toda alcatroada e de segurança, a vigilância e atenção era redobrada pois, tínhamos acabado de entrar num território de guerra apesar das informações recolhidas e de nos ter sido garantido a partir de que zona então sim devíamos estar preparados para qualquer eventual ataque do inimigo.
Neste trajecto entre Cabinda e o Dinge, passamos por uma aldeia, (de condomínio fechado) pois só os Americanos e alguns quadros da empresa que explorava o petróleo ao largo de Cabinda ali viviam, em casas onde se destacavam os equipamentos de ar condicionado e, todo o piso era verdejante, o silêncio era de cortar à faca cada um de nós carregava no seu semblante uma enormidade de dúvidas sobre o que iria encontrar contudo, o silêncio sufocava de tal modo que não permitia qualquer troca de palavras, a atenção no trajecto era enorme os olhares procuravam até onde desse o descortinar de qualquer movimento estranho, começava ali naquele momento a odisseia que nenhum de nós de certeza queria viver. A imposição imposta pelo regime colocava-nos numa situação como terminaria a comissão? saíria dali VIVO ou MORTO? Era a interrogação pessoal mas que, de certeza era comum a todos os camaradas que naquele momento seguiam em caravana espaçada, conforme determinavam as regras naquelas circunstâncias pois, a guerra era um facto, não era um sonho ou uma brincadeira.
Percorridos os 200 km chegámos ao Dinge, ponto de paragem obrigatória e planeada pois, era o local onde nos aguardava dois pelotões, do Batalhão que íamos render que, nos iriam conduzir até ao aquartelamento de destino “Belize”. No Dinge encontrei dois camaradas de Peniche, o “Manuel ICA” e o José Capelas, apesar da preocupação, foi com bastante alegria aquele encontro, pois a zona onde se encontravam era calma não havia problemas de qualquer natureza e tudo decorria normalmente, por vezes lá iam fazer uma escolta às viaturas civis que transportavam os mantimentos para o Batalhão que se encontrava na mata do Maiombe e também uma Companhia que se encontrava no Chimbete. Estes momentos permitiram retemperar as energias libertando um pouco a tensão daqueles 200 km. A partir do Dinge, a estrada alcatroada terminou dando lugar à picada, piso desconhecido, cheios de buracos e ressaltos das raízes das árvores, tínhamos entrado nas entranhas da mata do Maiombe, só se via a viatura que seguia à nossa frente, para um lado e para o o outro era só árvores e mato não se via mais de meio metro do banco onde nos encontrávamos sentados na viatura e a mata, o coração volta a bater, as dúvidas ressaltam de novo a atenção é redobrada, o silêncio estrangulante cada vez é maior à medida que a noite começa a surgir. Foi uma eternidade até chegarmos à tão desejada Vila do Belize.
O batalhão levou quinze dias até se encontrar totalmente instalado nos respectivos aquartelamentos destinados a cada uma das Companhias que o constituíam.
A CCS ficou instalada no aquartelamento situado na Vila do Belize.
A C.CAÇ 2655, foi colocada num aquartelamento situado numa povoação chamada “Chimbete”, os acessos a este quartel, através de uma picada sinuosa e íngreme, era no mínimo tenebroso pois, para além do factor das características da mata densa também obrigatoriamente se tinha que passar por
diversos troços de pântano. Esta Companhia logo no início da missão foi castigada com ataques constantes quer no quartel quer em emboscadas quando se deslocavam em movimentos de vigilância. Não me recordo mas, as baixas desta Companhia nos primeiros meses foram bastante elevadas ao ponto, da moral das tropas se encontrar destruída, e ter sido rendida por outra Companhia, deslocando-se então para junto da CCS no Belize.
A C.CAÇ 2657, foi colocada num ponto mais a norte do Belize, numa Vila chamada “Caio Guembo” bem encaixada no âmago da mata do Maiombe. O lema desta Companhia era “Firmes e Leais”. A área de intervenção da Companhia 2657, tinha os limites até à fronteira do Congo Belga. O trajecto para chegar a este aquartelamento era indiscritível, como era possível termos tanta resistência para vencer todas aquelas dificuldades quer da orografia do território quer o estado do piso.
A C.CAÇ. 2657,”Dianas Negros” foi colocada no ponto mais a norte do enclave de Cabinda, cada vez mais no interior da mata do Maiombe, na Vila de “Sanga Planície”, tendo no seu ponto mais alto, Miconge situado no cruzamento das fronteiras do Congo Francês e do Congo Belga um pelotão de morteiros não integrado no Batalhão mas que recebiam todo o apoio logístico e de manutenção desta Companhia. O trajecto para chegar a este aquartelamento é inexplicável, face às dificuldades quer da orografia do território quer ao estado do piso.
O batalhão levou alguns dias até se encontrar totalmente instalado nos respectivos aquartelamentos destinados a cada uma das Companhias que o constituíam.
Chegados ao Belize, terminou uma fase a que eu designei por “EMBARQUE”. Contudo novos desafios me foram colocados os quais irão ser descritos pela minha permanência na C.C.S. bem como na C.Caç. 2657-Caio Guembo.